2010-12-22

amor é #9

quanto te perdi disseram-me com palavras dóceis e inférteis que continuaria a ter-me a mim, aos meus livros antigos escrevinhados nas margens e às minhas próprias palavras (diriam com isto que continuaria a viver?). num rasgo de boas aventuranças e num olhar em frente expirado acreditei que sim e fui saltitando pelo meio do que achei ser um vazio manchado de insectospretosdaquelesquevimosaoacordar e 'technicolores' (era assim que aparecia nos lápis, que culpa tenho eu de aparecer assim nos lápis?) extenuantes, entre palavras soltas e desconfiadas aqui e ali, por todo o meu mundo esverdeado que é um bosque de Alice palpitante. 
agora que te ganhei de novo, ainda que apenas uma inspiração momentânea por só estares aqui a trocar umas lâmpadas (juro que os teus olhos me fazem uma imensa comichão assim pregados nas minhas costas curvadas e nos dedos mindinhos dos meus pés por estar quase quase a voar neste espaço branco aqui tão perto), sei que todos os meus livros antigos escrevinhados nas margens e todas as minhas palavras, mais ou menos próprias, se foram no dia em que te perdi. e, cheia de boas aventuranças e num rasgo de sorriso inspirado, i'm all about love.

2010-12-21

raspadinhas

tens liberdade para alguma coisa. não ta deram para andares preocupado com o tipo que coisas que deves ou não pensar, com o tipo de relações que deves ou não ter. quando, na flor da idade, te dão a liberdade das chaves de casa, ou seja, a liberdade de sair porta fora e ir por um caminho qualquer, conhecido ou não, acompanhado de máscaras ou de pessoas com quem és o teu eu-verdade, há que aproveitar. podes fazer o que quiseres, mas não deixes de fazer. não deixes de o fazer porque o dia que vem tem de ser assim meio-assado, porque está na altura de arranjar casa e homem próprio, porque não gostas da rotina. não deixes que o teu cérebrozinho do século XXI, cheio de moral, ética e comodismo (ou não!) tire de ti a liberdade que ainda nem teve o tempo e o desenvolvimento das papilas gustativas suficiente para se apreciar. também não estou a dizer para não deixares de fazer o que não te apetece só porque tens sono e os olhos inchados de chorar ontem à noite. não te estou a dizer para não deixares de estragar relações só porque a tua sede de amizade ou fama ou orgulho (ou sei lá o que se sente por aí) é demasiada para conter cá dentro. é só... se te apetece ir dar uma volta maior, boa viagem do fundo do coração.

2010-12-16

glance

- e trocaram olhares assim muito depressa, levantaram-se da mesa tudo muito depressa muito sofrêgo quase que apaixonado vai na volta ele assim muito depressa soube que...
- pois, e então claro que ele disse...
- ouviste o que eu disse?
(não. ouvi-o dizer que tinha comprado um relógio novo e vi-o de relance no pulso pontoado a ossos perfeitamente esculpidos pelas minhas mãos, o relógio que lhe dissera para comprar e que era lindo de morrer, que havia de ser herança de família se ele a minha, reparei-lhe de fugida no trajeito da boca quando sobe o pescoço, acho que tinha o botão do casaco meio descosido, eu que adorava aquele casaco às risquinhas azulinho lindo lindo)
- sim, tudo muito depressa..
- achas normal?! depois vem dizer-me que sou a mulher da vida dele, uma manhã depois de eu ter adormecido a chorar o meu cérebro todinho em conjunto com a matéria de biologia, vem dizer-me isto tudo e depois é claro que para além de cérebro fico sem coração, sem norte, sem sangue nos pés, vem dizer-me isto tudo, achas normal?
- acho terrível, acho terrível...
- estás mesmo a ouvir?
(não. acabei de reparar na ferida que tem no nó do indicador direito, provavelmente foi contra um poste, anda sempre tão sem pés na terra... deve ter sido hoje que tem o bolso do casaco, aquele casaco lindo lindo, um bocado descosido, foi um puxão qualquer, se calhar assaltaram-no, ai meu Deus que o assaltaram, ai se ele se magoou, ai meu Deus que horror que vida)
- sim, não me estás a ver olhar para ti?
- estou estou, estou estou! mas pronto, o que é que eu faço?
- vais comigo para a aula que já entrámos e não foi neste pavilhão...
- não é este o pavilhão?
(não. mas ele tem alemão aqui...)
- és sempre a mesma, sinceramente!
(sinceramente, quando é que começo a olhar de frente para a (minha) vida?)

2010-12-11

és o meu Natal

mesmo que estas palavras sejam um pouco atabalhoadas, devido à roda de histeria e emoção que me fizeste viver a partir do momento em que senhora da loja me deu os parabéns porque eu a rir a rir a rir e a dizer que te queria muito muito ir ver (hoje sonhei que se não dissesse muito muito não sentia de verdade), todas as outras, formais, inspiradas, violentas e docinhas, são todas tuas. todas. e sejas o que fores quando cresceres, o teu nariz irrequieto não me deixa mentir quando digo que vais adorar pintar macacos e corações em panos sujos para depois irmos os dois jogar à bola (vais é rir-te à gargalhada). és o pleonasmo mais fofinho e pequenino e amoroso que eu conheço, e um dia vais ver como as figuras de estilo são a minha vida.

2010-12-03

chamo-me Margarida e sou um jardim

(não sei que direito tenho de escrever sobre mim dado que nunca o fiz por estar sempre comigo e assim não me achar de interesse geral.)
uma vez, num banco de jardim, disseram-me, em jeito de conversa poética, que Deus tinha posto as flores no mundo para o enfeitar e, portanto, para fazer as pessoas felizes. foi aí que, mais que flor, quis ser um jardim.
ainda sou uma menina. nunca ganhei prémios, nunca uma obra acabada, nunca um acto sem ponta da minha personalidade emotiva e impulsiva. mas, do alto da minha adolescência, disse “é por aqui que vou” – já sou uma mulher.
sou um depósito ajardinado de lições de vida, manhãs de praia, cicatrizes abertas e basicamente tudo o que me inspirar a contar histórias aos outros (não é isso o amor?), contando ainda com o meu egoísmo tímido cheio de sonhos e esperanças vãs, a minha descoordenação motora e trapalhice habitual e desorganização um tanto ou quanto planeada para que num instante um mundo conhecido, mas novo, à minha espera.
comecei pelo que sou actualmente porque tenho para mim que teoricamente, é pelo “hoje” que se começa. nascida em vésperas da revolução de Abril, vivi sempre na minha Damaia do coração e nunca o achei limitativo, por aumentar a sede de conhecer, a imaginação de viver e muito mais vantagens que se rimassem até discriminava. na minha vida e para mim, momentos dignos de palavras escritas são-nos todos, desde a minha Profissão de Fé à senhora que me perguntou porque chorava sentada no chão duma rua que já não me recordo qual, passando pela minha primeira composição e pelos beijos que me queimaram noites de estudo.
menina e flor em demasia para contar os meus feitos e recompensas, só me resta fazer com que me torne um pouco jardim e mulher para ser capaz de os contar, sem que ninguém os escreva por mim.

(só porque o stor de literatura fez questão de ler para a turma inteira e eu fiquei a morrer de alegria quando mo contaram, já que hoje foi dia de cama.)

2010-12-01

não sei de que fala você aqui dentro

porque é que fui eu que fiquei aqui? porque é que fui eu que tive de nascer com o sonho, não de escrever, mas de ser poesia? eu sei que não vou ser nada na vida, e os meus pressentimentos dizem-me que não vou durar muito por aqui. não vejo o tempo passar, vivo de passados decrescentes e de presentes futéis e nao-desejados, de investigações levianas e sem sentido até para mim que nunca pricipiei a fazê-lo, procuro um chão que foi mudado, onde escrevi já cartas de amor a mim mesma, não sei o porquê das vírgulas já que eu ponteada de finais, nunca sei onde tenho ido, depois reparo que a lado nenhum porque fui eu que tive de cá ficar, comigo, não sei porque só eu é que tenho sempre de ficar comigo, nunca disse a ninguém que gostava nem de mim nem de ti, poderia dizer que o amor salgado e saudoso é o único elemento coeso na maior parte dos pedaços da minha quase-vida, cheia de paragens de autocarro onde não paro nem arranco, surpreendi-me a mim mesma e por mim fiquei, fui ficando, continuo a ficar, pareço uma flor de antigamente sempre tão apertada e cheia de espinhos, mas não posso, não sei de que fala você, amor e poesia o que será isso, gostava de retornar a criança e aí recusar todas as palavras que me quisessem enfiar nos ossos da base do pescoço (acho que é daí que nascem as minhas letras), não posso, amor e margaridas nem coesos nem coerentes, não posso, continuo sem nunca poder falar, escrever, falar ou escrever esses que são os meus únicos amores e poetas (soubesse eu o que amar e falar significa), não posso, não quero e continuo a não poder e a não querer ficar, mas fico, fico sempre, não por mim e não por ti, porque eu nada na minha quase-vida.

2010-11-29

do sol poeirento

quero gritar devagarinho. quero gritar devagarinho porque eu mil e quinhentos gritos separados pela mesma dor, e se mil e quinhentos gritos todos separados saíssem pela minha garganta, eu, carne e coração a menos, pó. e o pó não grita. faz atchins separados todos pela mesa comichão, e eu, então, uma doença infernal e incurável de anomalias todas separadas pela mesma dor. quero gritar devagar porque assim talvez possa voltar a ser uma unidade como as crónicas de Lobo Antunes não sei em que lugar no mundo, eu que já nem gosto da chuva que me molha e não me deixa olhar em frente por causa dos óculos. quero gritar devagar porque pode ser que assim talvez possa voltar a ter voz nos dedos, mas as minhas unhas, essas, roxas e afónicas do frio que me anestesia a única coisa que eu, asseguradamente, tenho: dedos dos pés. assim, calo-me. odeio-te em silêncio por me encaracolares o cabelo (eu sempre tão lisa e sedosa), mato com os olhos as aranhas nas escadas mais escuras e represento-te a mímica mais perfeita e plástica que possas ver, danço sozinha e no escuro os passos que aprendi, conformada, no outro dia (porquê tantos adjectivos entre vírgulas?), e toco apaixonadamente estátuas de pedra mais fria que a minha mão esquerda, mil e quinhentos bocejos todos juntos. já não gosto de àgua clara do céu, perdi os meus anos, os bocejos pegam-se-me sempre e vou-me embora. caladinha.

2010-11-28

com amor

alguém me ajude, vou ter negativa à minha disciplina favorita! mesmo assim, noticiar-vos a minha vida faz-me muito feliz.

2010-11-24

limites

dói quando ouço música. dói quando jogo às cartas. dói quando ando na rua mas isso é só por causa da anca. sinceramente, tenho um pico no dedo mindinho que nem com palavras lá vai. é por isso que me dói quando os acordes tocam aqui. dói quando vos dói porque eu tenho de sentir alguma coisa, ainda assim. sinceramente, a dor não é assim tão má. (é só a anca)

2010-11-22

da música portuguesa

se vais jogar até morrer, habilitas-te a perder
se não tens nada para ganhar, o que é que tu queres apostar?

B FACHADA

2010-11-18

(despreocupação para com o título)

(antes de tudo, e porque gosto muito muito dos meus seguidores, aqui a flor agradece muito muito se me derem uns cheirinhos para a minha autobiografia de literatura. shiu que é segredo, mas vocês, sem querer, sabem muito muito sobre mim. podem mandar-me as vossas ideias para o mail ou por comentários, fico-vos eternamente agradecida!)

ela até estava cheia de sono, não sabia o porquê de ali ter ido parar, nem sequer ironizar lhe apetecia e uma sede enormíssima duma água que raramente bebia apareceu-lhe não na garganta, na barriga, e ela refastelada como uma postura que bem treinada não deixava e mesmo assim sem se importar, um desleixo para com o sono, um vai-te lixar para a vida ou o que sejas vai-te lixar, no entanto uma realização despreocupada e triste, uma felicidade vazia mas extrema, e uma luz de vez em quando e ela contente por tanta gente a responder-lhe torto, ela contente porque responder torto sinal de conhecer almas e corações e seja o que for que existe dentro (ou fora, nunca sei onde paira o que quer que seja que existe) de nós, e num instante, numa conclusão e num parágrafo só, ela feliz, cheia e despreocupada com o facto de tanta gente lhe amar o que quer que seja que ela lá tenha dentro.

2010-11-13

andré

lembra-te sempre do dia de hoje. de nós os dois a brincarmos aos mergulhadores no banco do jardim um bocadinho longe da tua casa onde a tua mãe só te deixa ir quando sou eu a pedir para te ir buscar à escola. lembra-te sempre de quem ganhou ao 'rir mais alto': fui eu, porque eu é que sei, que eu sou mais velha! - acho que acaba por ser a única coisa que muda com o ser mais velho: podes dizer eu sei muito mais vezes, com todas as conotações possíveis e imaginárias (shiu, nunca vais saber nada por de mais). mas lembra-te sempre, por favor, que brinquei contigo e tu até ficaste mais alto que eu em cima daquele baloiço donde eu cai e tu não vais dizer a ninguém como porque é um segredo só nosso. se te lembrares sempre do dia de hoje, prometo do fundo do meu coração de flor (sou a flor que um dia desenhaste no papel do restaurante e me deste para sempre) que irás ser muito mais feliz. e quando alguém te disser que já não tens idade para brincar aos mergulhadores e andares de baloiço, manda-o, como tu dizes, às relvas.

2010-11-11

se calhar não quero ver

uma a uma, dexou cair as cartas que lhe escrevera. todas elas: no chão, na arca dos gelados do café, na paragem do 711, na ponte, na gaiola dos canários do avô, numa das gavetas do melhor amigo. todas elas, inteiras e intactas num anonimato previsível. aí, principiou a arrancar de si todas as suas partes constituintes cujo 'seu' já não siginificava nada. encontrou-se assim num chão de ladrilho inspirado pela romanização, e aí uma confusão de risos, palavras, pernas, (não os cabelos, sempre independentes de mais os cabelos), camisas, pestanas, papel magoado, verniz das unhas (tão anónimo esse), impotência, lençóis, sangue, teclas de computador - um g gasto -, carne e qualquer coisa como se alma, tudo num chão tão seu país, o chão um país, aquele corpo um país em si também. e por aí ficou, nação ou não, uma confusão de tudo, de todas as elas sejam quais forem, dias e dias sem sequer um olá ao sol (esta gente sempre tão mal educada para com o sol), uma confusão de tudo e tudo sempre muito mais que vivo e fresco, sangue vivo e carne fresca que continua a arder nas extremidades. chegou uma semana qualquer que não viu passar por si e recompôs-se, fez-se o corpo seu de todo, uma e outra vez. aprendeu a ser chão, e seguiu.

2010-11-07

só para que vejam, estou vivinha

e hoje, que os picos e o trabalho são de mais para que as palavras me compreendam (nunca sei quem compreede quem, nem como alguém se diz compreender outra alma já que eu nem a mim nem ao chocolate compreendo) era para postar aqui uma frase do António Lobo Antunes, do seu Livro de Crónicas. depois de continuar a ler e de encontrar mais mil e quinhentas frases (odeio dizer 'frases' neste contexto) geniais, só me resta recomendar-vos o livro todo.

2010-11-01

evitar

desculpem-me o tema primitivo, a fórmula gasta de sucessos. desculpem-me também a impulsividade e o desespero latejante e calmo que se arrasta e fatiga pelas linhas da minha mão que consequentemente passa para aqui, linhas justificadas por um cérebro adormecido e confuso (os meus sonhos? isto é só matéria de geografia, OS MEUS SONHOS?). desculpem-me se por acaso perder o rumo ao texto: previsível imitação dos dias. desculpem-me a falta de genialidade no uso do vocabulário, a ordem das classes e subclasses mal educada, o estúpido, não tens outro nome, desaparecimento do meu estilo próprio marcado como o feitio das minhas mãos descomplexadas, mãos espelho de alma, oxálá um reflexo de luz directa. desculpem-me só, porque o amor e o abismo fazem destas coisas. assim como a mudança (juro, juro que já a desculpei). será que tem tudo mesmo uma razão de ser? mesmo os temas primitivos e as músicas desenterradas na altura certa (certa apenas se tudo acompanhado de razões ao pequeno-almoço). era só... desculpem-me.

era para ter mais umas quantas linhas

era uma vez um sonho. (vais sonhá-lo agora, fecha os olhos devagar)

2010-10-30

a mulher moderna

a minha vida não é todos os dias. passa-se à sexta-feira, às 18:08 mais coisa menos coisa, quando o comboio que vem de Mirasintra (não tenho a certeza se Mirasintra) trava e faz barulho na linha 4. amigas que ostentam com orgulho o mesmo estatuto que eu, solteiríssimas e bonitíssimas por opção, (supostamente por opção), sorriem com admiração ao elogiarem-me o facto de ter sido pioneira nestas andanças.mas o que se passa é que não deixam de me olhar com mágoa, quando me vão buscar ao balcão de informações que me dá um salário pequenino, suficiente para jantar em casa, decorá-la aos meios centímetros e ir um mês ou outro ao ginásio. olham-me com especial suposta compreensão quando à sexta-feira lhes digo que tenho uma reunião, às 18:08 mais coisa menos coisa, e não posso ir dar uma volta nos combios (livre-trânsito não no ginásio, nos comboios). é que, optimismo e opções à parte, a minha vida não é todos os dias.

2010-10-29

2010-10-27

3 em cada 15 segundos

o que é feito dos que amam como nós? e dos meus textos sobre bananas? porque é que estou com lágrimas nos olhos e nem uma infelicidade hoje? porque é nos textos formais se põe tudo em justificado? onde é que tens aulas a esta hora? (quero ter uma visão tua como naquele filme dos vampiros, só para ter a certeza que gosto de ti como é suposto aqueles que gostam muito gostarem) podemos encontrar-nos amanhã? havia trabalhos para filosofia? Mano, jantas hoje? (com que frequência dá Deus os mesmo nomes?) posso ir a salamanca o mês que vem? lembras-te de tudo, tudo tudo tudo? e se te oferecer uma flor, aceitas? (chamo-me Margarida e sou um jardim) nunca me fizeste os crepes com chocolate. para quando os nossos crepes com chocolate? todas as músicas são minhas (queres um bocadinho?) que filmes estão em exibição quinta-feira a oito? olha, parti os óculos. sempre vamos ao cinema?


(há uns dias)

2010-10-24

cara de rainha, sei bem para onde vais

eu devia estar a estudar. mas estudar dói. porquê tanta gente a descobrir tanta coisa tantos dias seguidos, e eu parada na janela?, a velhota sobe com o carrinho das compras, a menina que se quer mulher hoje desce com cara séria de rainha, uma folha cai (já outono?!) e por ali fica, parada e preguiçosa. tenho a certeza que está a olhar para mim. tenho a certeza que nela também uma dor de apanhar injecções se, por acaso, tivesse de estudar. ela nunca descobrirá nada, nem eu descobri, matérias quaisquer em que sejam necessários o isolamento total da população comum e um estudo de tubos de ensaio quentes e frios. somos meras observadoras em organizações mundias, não lançamos as redes de pesca mas embarcamos de madrugada. tenho a certeza que nela um impulso qualquer e um big bang prontinho a sair nas nervuras já amarelas. sei de antemão que irei amar esta folha. provavelmente inventarei mil e quinhentas histórias para que não morra o amor que lhe tenho apenas porque, parada e preguiçosa, caiu. prometerei que nunca, nunca na vida a tratarei como inferior só por lhe estar a fazer um favor.
amei uma folha e morri por dentro. foi o fado que pus na aparelhagem, nada contra. um classicismo que estimula o cérebro já decomposto e uma secura nos lábios e aparcebi-me sem vida (onde é que eu a pus? tenho a certeza que junto à flor da casa-de-banho, na gaveta mais espampanante que lá tenho, a vida?). então aí, já tenho duas opções. ou morro por dentro e nada vale a pena - o mérito académico, os amores que tive com amigos que perdi, a minha avó de feitio igual, todas as sextas à tarde, apenas pontuais domingos de manhã, as lágrimas de alguém que não meu no bolso do casaco castanho que por acaso tenho de arrumar no cabide quando estudar deixar de doer - e nada vai merecer o meu trabalho, nem eu o dos outros. ou então sai um big bang agridoce do meu coração. já vos tinha dito que não gosto de ver folhas secas na calçada portuguesa?

2010-10-20

a luta continua #4

- podemos falar todas?
- não.
- vai dormir uma horinha, está bem? andas cansada.
- por isso é que eu queria falar...
- NÃO! não é a falar que as coisas melhoram, não é a falarmos que vamos sorrir de novo, que vamos andar todas aos abracinhos, não é isso que andas para aí a dizer, que não podemos falar? vai dormir então!
- é só que, vocês sabem, eu tenho de estudar, vou ter lá abaixo ao café daqui a nada, não dava muito jeito.
- porque é que nunca te dá muito jeito viver com coração?

2010-10-18

eu: três montanhas e um rio

acordou estremunhada e nem um esforço para adivinhar em que posição acordara e no que estaria já a pensar. levantou-se e desinteressada abriu os estores, sabendo de ante mão que isso a iria atrasar uma boa meia hora. demorou-se em tudo -  a tomar banho, a calçar as meias, a escolher a roupa sentada no roupeiro (porque razão me sento eu no roupeiro?), a descer as escadas, a pensar em bons-dias vazios, a comer qualquer coisa (pai, lembras-te do que acabei de comer?). saiu de casa e foi à exposição dum conhecido - fotografias de pessoas cheias, os olhos (o brilho?) vazios. comprou bilhete, subiu as escadas num momento e pôs-se no comboio esquecendo a paisagem que sempre lhe fizera cocégas, chegou à escola, não viu ninguém, foi à aula (nunca um atraso) e seguiu. à noite sentou-se e esperou até à hora em que as pessoas de vida cheia se vão deitar e deitou-se, fechou muito muito muito olhos porque ninguém vazio quer o entretanto antes do sono.
(click)
acordou e riu-se para si dos braços caídos, pôs-se num ápice na janela e piscou o olho ao céu por estar bonito só para ela. rasgou um papel do caderno do irmão e escrevinhou isto na sede saudosa dum espírito que sempre seu lhe oferecera céus destes, pintados por si (então um sol cor-de-rosa-pastilha-elástica, o céu azul-pena-de-pato e nuvens verde-aguarela). mesmo que atrasada, sentou-se no roupeiro e escolheu a roupa, comeu um quadrado de chocolate (tu continuas a comer disso em jejum?!)e foi-se embora, encher bons-dias. não se lembra de quem viu mas foi às aulas e seguiu com sorrisos cheios de cantigas de amigo que ia encontrar faz anos depois, chegou a casa e deitou-se cedinho, porque toda a gente anseia por um entretanto com quem ama.

2010-10-17

vem aí o inverno

o facto de eu andar de saltos em casa está directamente relacionado com o meu gosto por sandes de carne assada e queijo (queijo daquele amarelo tipo mcdonalds). o facto de me dizerem que me enquadro sem me enquadrar faz-me parecer uma monalisa falsa e assimétrica, com apenas um meio sorriso (meia felicidade? ou felicididade às metades?). o facto de estar sentada a escrever, numa máquina traidora que me esfaqueou toda a confiança que nela tinha depositado, e o facto de estar a gastar palavras (lindas que me tiram os picos e o escuro) a falar dela, não tem exactamente a ver com nada, já que isso do nada gosta muito de mim. mas eu sou uma guerreira, sou! faço makahamé se for preciso e dou-te beijinhos se te aleijar. como uma verdadeira poetisa, que seria se realmente fosse uma lutadora eloquente, que usa sapatos extra extravagantes e isso tudo. e poetisa que sabe estar, ainda assim.
vale-me o facto de nunca ter posição, de não parar quieta, porque ainda tinha de ir a Bragança hoje ver se uma loja artesal de que me falaram ainda estava aberta (só ver). valer valer, valem-me as palavras, que se não fossem elas em vez de sentada eu de cócoras a deprimir, a dizer que as borrachas para além de não me apagarem toda, contigo incluido, não param os raios. (afinal o tempo lá fora diferente do que eu imaginara).

2010-10-15

tenho dito, um bocadinho diferente

é bom estar de volta, mesmo quando sozinho num mundo que não o teu. (procuro urgentemente hotel não muito caro onde deixar o meu coração porque o resto foi de férias)

2010-10-13

BISCAS BANANA

esta é para a biscaia. não me interessa se pessoal. esta é para a biscaia, porque se hoje não fosse para ela nem sequer ia ser hoje. para já, NÃO GOSTEI de ir com os joelhos contra a quina de madeira da cama que está no canto esquerdo lá a frente ao pé da janela, porque uma pessoa quando chora merece dignidade! mas gosto muito de saberes porquê é que faltei às aulas hoje e nem tomaste o pequeno almoço com a minha mãe. também gosto muito de te impingir almoços com tangerinas, e gosto muito de dançar à monga contigo. hoje vou mesmo dizer a porcaria toda que a gente faz, até os teatros no meio da rua. assim não te ligo a deprimir pela vigésima quinta vez esta semana (número real). lembraste do velho dos pombos? e do saco do pão que te está neste momento (caraças pó pão) a mutilar o dedo? e de dançar à chuva a dança da melonga até à Igreja? já chega, vá.esta é para ti, e dispenso lamechices porque os meus olhos andam sensíveis (juro que é das lentes). quando for aí a casa vais ficar sem o calendário geológico.

2010-10-12

sou para ti, pequenino.

olá pequenino. como sabes, sais à tia e tens bicho carpinteiro. sei perfeitamente que só tu me compreendes (ai de ti que digas ao pai!), e agora que já sabes disto das palavras, tens mesmo de saber o que elas vão contar para ti. elas são como tu, e como eu: têm bichos por tudo quanto é sitio, coçam o nariz, dão cambalhotas, brincam com as pestanas, tremem os joelhos, coçam o nariz, brincam com os lábios, mudam de posição e dão cambalhotas. mas vais ter que tentar ser como elas quando tiram as pessoas do escuro, quando fazem os olhos de pessoas como nós brilhar (e sem ter de olhar para o sol!). um dia, as palavras vão desiludir-te, quando fores mais moço que menino. mas não lhes ligues - sabes como são distraídas. vai chegar a altura, também, em que os teus amigos, mais moços que meninos já, vão precisar de ti. e não vai ser para brincar à apanhada. aí, não ligues a quem te diz mais menino que moço, porque vai ser tempo de seres homem; pede ajuda às palavras. vai chegar ainda um minutinho, talvez apenas uma dúzia de segundos da tua vida que vão ser os mais importantes da tua existência. vais conhecer uma menina (se fores homem das ciências perceberás que componentes reagem aí dentro), uma princesa, por quem vais ter de ser capaz de acordar cedo e perder o teu programa de televisão preferido. ainda por cima, as donzelas costumam ter um feitio danado. não lhe ligues: vais saber-lhe a distracção de cor. já te contei, antes de adormeceres, porque é que fiquei para tia, só para ti. haja o que houver, quantas semanas forem, e quantos berros deres no meio de discussões: não sejas como eu, nem como as palavras.

vá lá

vem princesa, e deixa o teu coração sonhar

(aladino)

2010-10-11

atchiiiiim

quando eu espirro (e acabei de espirrar) lembro-me do meu avô. que está lá, na casa dele da outra banda a tratar dos cães dos vizinhos, e que diz que eu sou má, e nunca lá vou aprender a andar de bicicleta, e que quando cá vem me tira o ar com os abraços cheios de dor do reumatismo (artrite?). o meu avô que atura a minha avó com as rastas que ela põe e com as idas ao ginásio, que vai dar uma panela de pressão à minha melhor amiga quando ela casar, daqui a muitos anos porque namorar faz bem à saúde e a faculdade também conta. quando eu espirro tenho de ser feliz, porque uma pessoa tem de sorrir para o esforço, diz ele, que só tem rugas de felicidade (não tem sequer aquela entre as sobrancelhas, é de rir de barriga cheia). espirro pouco no verão. porque é que nunca me amo no inverno?

2010-10-10

porque hoje me dói o ouvido

o nosso amor é como a família - não se escolhe. o que me leva a perguntar onde estarão aqueles que andam de família de acolhimento em amor não biológico, e onde estão todos os que se chatearam com aqueles, que estando cá dentro não se escolheram, para sempre. os que como eu se cingiram ao quarto do fundo, ao anexo da casa. que nem a uma data de início com tantos anos de bagagem têm direito. que, ficando com as meias rotas e isso tudo, não deixam de se sentir orgulhosos daquelas pessoas que não escolhemos e que muito menos nos escolheram a nós, e de ganharem o dia com sorrisos sem olhos nem dentes entregues a quem precisar de menos de meio segundo de alegria.

2010-10-06

nunca sei dos travões

podias-me ter dito é a frase que mais me ouço dizer. à minha mãe, ao meu vizinho, àquele amigo esquecido duas ruas abaixo. mas a mim mesma. um tumtum desesperado, e um pfff de remédio que tem de ser feito, só porque sou distraída e a maior parte das vezes, de alma leve e grata. podias-me ter dito que já não havia manteiga, podias-me ter telefonado antes de adormecer, podias ter-me dito que mal uma distância de mais 10 km iamos desaparecer da vida um do outro. podiam-me ter dito, as árvores, as escadas onde escorrego todos os domingos chuvosos, o Jardim Zoológico (não, à 2ª não vai ser de vez), os croissants aquecidos que ias crescer mais que eu, a velha do papel higiénico que nós as duas não iamos dançar mais à chuva. podiam-me todos ter dito que ia ser assim, e provavelmente cairia exactamente no mesmo sitio, mas já não tinha desculpas. podia ter-me doído a anca, estar mais sensível por causa do período, ter um chapéu-de-chuva amaldiçoado; tinham-me dito.

2010-10-03

ainda estou para perceber

hoje, que toda a gente fala da chuva, eu digo-te, o nevoeiro é muito mais além. sentada com um anormal, fria da chuva, a casa de portas partidas e paredes doentes tomava as formas que bem quisesse. isto porque o nevoeiro é meu amigo. isto porque a capela molhada continua a ser acolhedora, e um amor vazio continua a ser mágico. hoje não sei que escreva, porque a chuva passa a vida a trair-me. antes eu até me sentia bem. uma manta azul e cabelos molhados porque pessoas normais hão-de sempre ser chatas, e eu a modos que estava contente. mas o nevoeiro dissipou. afinal tinha mesmo voltado a ser quem era, onde sempre fui. bolas. raios partam o nevoeiro.

2010-09-28

túnicas com girafas

estás encostada ao prédio ao pé da cabine do telefone favorita de emigrantes que não têm dinheiro para mandar à família lá longe, contente por não seres a única infeliz neste mundo.não te interessa sequer o que a tua consciência pensa de ti. ouves africano, brasileiro do interior, mandarim, indiano. ninguém te vê. talvez a tua própria consciência o saiba, és invisível, ninguém te vê, não há dinheiro para o rebento mais novo, o mais velho que quer seguir com os estudos, a irmã que está grávida e fogo que é uma menina, tudo na mesma cabine, a rede sobrecarregada de infelicidade que não tua, bom, juro que isso é bom, vais aprender estas línguas todas um dia quando fores para a faculdade, vais saber a língua toda da vida quando no estrangeiro o teu traquejo não vale dinheiro num envelope, estás suja, usada e invisível, mais invisível que suja porque não um cheiro, na cabine azul e branca uma palavra que te caiu em cima, trouxe-te tudo de volta,uma e outra vez (se pudesse rimava agora, um som igual numa prosa corrida, uma palavra que me caiu em cima, uma rima aqui, por favor), do outro lado da linha sabes todos os porquês. desfazes-te porque já nem prédio, a tua vida era um prédio de desgraças com cabine ao lado, quem te disse que uma vida são escadas de desgraças? eras uma sequência limpa de paus, preto, trevos da sorte, eras um prédio com cabine ao lado, desfizeste-te, tanta gente na rua e o que pensa a tua consciência de ti?

2010-09-23

vou esquecer-me disto amanhã de manhã.

amor proíbido não é das histórias. não é fruto mais que apetecido, sequer. não faz com que morramos com facas de algibeira. sabes os frutos secos? é isso que eu sou. ou por aí. mas o amor proíbido é aquele das janelas entreabertas à meia-noite, só para cheirar um rasgo de alguém e num momento uma sombra dos dias seguintes passados com esse, da cor e cheiro de chocolate e jasmim, é? o proíbido não era mau? chocolate e jasmim é bom. e o amor ninguém o proíbe. só quem ama! se eu amo? esqueci-me. amor proíbido não é fazer tanta força a fechar os olhos que parece que quando os abrirmos vamos estar noutro lugar? (eu ia à Gardunha) eu fechei os olhos com força, sabes, e proíbe-me de amar no entretanto. de te amar. e quando abri os olhos (Gardunha sim, Gardunha não), tinha-me esquecido. não é isso amor proíbido? "proíbido comer chocolate" e a gente esconde-o, nas arrumações da garagem. e quando, desesparadinhos! lá o vamos buscar, cheira a borracha dos pneus e sabe a veneno para baratas. o meu amor cheira mal, ele que nem sequer gosta de regras. amor proíbido não era isso? ser um amor tão mau, tão mau, mau de nos arrancar o cérebro e mesmo assim nervos em tudo quanto é sitio? onde é que eu os fui buscar? eu que aprecio tanto a minha massa cinzenta. mas vá, um amor tão mau, tão mau, que passa a ser má companhia. eu não ando com más companhias? sabes, merda para o meu amor proíbido.

2010-09-20

esperanças de que saibas disto, então?

ainda dizem que isto não existe. ainda pensei eu serem as minhas hormonas, uma reacção química qualquer, ciência pura a razão para estar tão atordoada. a razão para me levar a dizer que por ti fazia 300 km sem sequer saber o dia dos teus anos, a tua cor favorita. a razão para escrever sobre amor e um sorriso parvo, para estar neste frenesim, eu que estou tão tranquila. deste-me um sorriso breve, dispensado a todos. tens noção do que me deste? esperanças dum inverno cheio de neve e serenatas com a tua guitarra. esperanças dum chocolate quente no meu coração, outra vez. a minha cor favorita é o verde e nasci e em vésperas de revolução. sabes o que quer dizer?

2010-09-14

barreiras

preciso de casa, outra vez. ando a pensar bastante nisso, porque falta qualquer coisa, a maior parte das vezes. preciso de uma mantinha no sofá e um chocolate quente, e preciso de dançar em cuecas. mas tudo psicológico, não vontades aleatórias. preciso do meu jornal, dos meus amigos, grandes, resplandescentes e antigos, dos meus amigos! preciso da minha serra cheia de nascentes. e preciso de uma outra casa, noutro lugar. falta qualquer coisa, a maior parte das vezes. fartei-me do stress, mas continuo sem gostar da pasmaceira. não sei para onde vá, onde fique, com quem almoce. mas vou e fico e almoço, é porque tem de ser? eu nunca usei aliança, ando despojada de objectos marcantes nos pulsos ou nos pés ou no pescoço, então porque é que apalpo os bolsos e sinto que falta qualquer coisa? a maior parte das vezes. eu não quero o inverno a dormir comigo, mas ele vai chegar e eu vou vestir casacos. tenho os olhos pesados, dores nas pernas e continuo a pé. tenho casa, preciso de casa. porra, mania do Homem de querer sempre mais.

das mudanças

a escola onde andava tem mil e quinhentos motivos para que toda a gente diga mal dela. tem gente que não cabe na cabeça de ninguem, pavilhões velhinhos velhinhos onde chove nas salas, tem muitas negativas nas pautas. mas, sabem, as salas de aula têm paredes cor de rosa. é isso que interessa. verde cócó não é para mim!

2010-09-06

peço desculpa

mas tenho preferido o meu caderninho e as canetas que vou encontrando. (férias, isto ainda são férias!)

2010-09-02

em casa, portanto

reparei há bem pouco tempo que onde penso melhor em mim, no mundo e nos outros é mesmo aí. comigo, com o mundo e com os outros. há muita gente que fecha a porta do quarto, se deita na cama, mete uns fones nos ouvido, e diz para si 'vou divagar'. e divaga. eu não consigo, fogo. quando o faço, penso em filosofias do papel higiénico e na melhor maneira de convencer o meu pai a ir passar mais fins-de-semana. e isso é tão terrivelmente estúpido. eu tenho de ir lá para fora para perceber o que isso é, tenho de olhar para as pessoas pare perceber como funciona um coração. o meu, a maior parte das vezes.
e depois reparo que tenho a capacidade de chamar casa a mil e quinhentos lugares, e chamo casa a pessoas. sabe bem, agora.

2010-08-31

ai!

e não é para fazer inveja a ninguém, mas neste verão, houve uma daquelas cenas românticas há filme previsível. (e soube mesmo bem!)

2010-08-26

grr

um dia conto-te as histórias todas à meia-noite. para teres medinho, olhares para todos os teus lugares no escuro. à meia-noite todas as histórias são sórdidas e vadias, e eu vou contar-te umas poucas. rapagão sincero e esclarecido o tanas, vais ligar-me a chorar e aí, o mar que te beije, ouviste? O MAR QUE TE BEIJE! não, não preciso de asneiras no discurso, nunca fui vulgar, por mais que o injectes na minha cabeça, nem o vou ser, não tenho medo do terror escrito porque terror com flores existe e sou eu que o imagino, eu, que posso e mando nos livros que quero, não só eu invulgar, toda a gente, mas não, nunca vulgar apesar de toda a gente. menos tu. tens pânico a cada palavra que salta do papel para a minha boca, arrepios a cada palavra fugidia, da minha boca ou de outra qualquer, tremores e ainãocontes. o mar que te beije, o café que te aqueça, alguém que te puxe numa garra insensível qualquer, sem nunca perceberes como eu sabia ser sedenta de ti, sedenta e doce, sem nunca, nunca perceberes no escuro do teu coração, na montanha-russa da tua cabeça. mas sempre, sempre a sentir falta.

2010-08-21

auto-satisfação

podia ter tirado uma fotografia. agora que só os bicos dos pássaros e o vento nas folhas, realmente!, podia ter tirado uma fotografia. o pôr-do-sol a bater nos pés de unhas pintadas, um céu azul por trás ponteado por montes de uma serra alta. altinha, só (meio-termo, meio-termo). e durante segundos a inspiração esvaiu-se e apenas um impasse abismal. ajeitei-me mais naquela posição esquizofrénica. era o cheiro, tudo o cheiro. lenha a queimar que não se fazia ouvir nem acalorava no pescoço. era tudo para vocês, a fotografia. mas as pessoas são inseguras e egoístas, pois era tão só a chegada. o fazer um vale tão de porto de abrigo, uma terra não prometida mas garantida, feita de promessas de estrelas maiores e ar.
ficaria decerto uma boa fotografia. moldura incorporada - a borracha da janela aberta do carro -, os pés, o pôr-do-sol e a serra. faltava-lhe tudo, portanto. ajeitei-me mais no banco, que tinha preguiça de me levantar.

2010-08-19

do regresso

quando um dia escrever um livro, este chamar-se-á Alpedrinha, porque mesmo que pelo mundo, foi lá que o escrevi.
(e a todos os que nunca lá foram, um empurrãozinho. bem haja!)

2010-08-05

para o natal, eu quero!

eu sei que não acerto com o português. que não sou entroncado o suficiente para te proteger de tudo quanto queria e que repito demasiado a mesma coisa quando estou entusiasmado. que às vezes me desligo um bocado e deixo de perceber que o teu coração tem muita coisa lá dentro e a maior parte do tempo (do tempo, do espaço) não está arrumado. eu sei que não me devia importar quando me tiras fotografias aos pés. mais que tudo, eu sei que te sentes frustrada quando te tento ensinar a andar de skate e tu não consegues (ahaha, esta até teve piada), mas foi essa tua dissincronização toda que me fez gostar de ti assim, tão devagarinho. não foi o teu excesso de vocabulário, o teu cabelo, as tuas notas na escola e o facto de termos os dois o mesmo nível de pontualidade (não nulo, quase nulo). não foi tão pouco a tua paixão pela arte ou a nossa adrupta parecença e diferença em certas coisas. mas a tua maneira de estar tresloucada e a maneira como gostas de saber rir-te sozinha, fogo.

2010-08-02

ufa

ela entrou em casa. em casa, mas numa casa que ninguém sabia sua. tinha marido e casa harmoniosamente moldados a si, ambos futuristas mas sentimentais. mas hoje decidiu-se a ir para sua casa, posar as chaves que durante os dez minutos em que ela deixou o ar pousar foram o único barulhinho por ali. havia ali muito branco pintado por ela - as cadeiras e as mesas num branco translúcido que deixava ver a madeira; a colcha da cama, os cortinados; as fotografias grandes, muito claras com traços de felicidade. fora ali que ela deixara a felicidade, para que ninguém a soubesse sua. e ela descobrira-a branca, mas não sem traços mais fortes que a fizessem ver. era tudo muito branco, mas traços fortes de cores quentes, frias e abstractas, vindas de culturas visitadas noutros tempos não moldados a si mas tão mais harmoniosos, não a deixavam perder-se. aquele monumento a si própria nunca a deixava perder-se da harmonia feliz que aprendeu a viver. e ela já andava a precisar.

2010-08-01

eu não gosto de saladas que não sejam temperadas

tenho a mania de me revoltar com a maior parte das coisas que me enervam. e depois? ando sempre cheia de manias e tenho pancas a mais. sempre quis ser diferente - desde pequenina! mas agora é diferente. começei a querer querer ser diferente (não foi um lapso na escrita, repito: começei a querer querer ser diferente). isso irrita muita gente, mas temos pena: sou práctica no que toca à profundidade e para além disso, não tenho muito interesse em conheçer o meu todo. sou cheia de cores e tenho a perfeita noção de que isto aqui é maravilhoso, apesar de às vezes não o sentir da melhor maneira; mas isso passa-me rápido (respira fundo e olha para o céu, olhos de esperança).
(reli o texto e não me fez sentido, mas de qualquer maneira, é nisto tudo que tenho andado a pensar. pode ser que vos interesse para alguma coisa!)

2010-07-30

obrigada, bichos!

MAR, flores. amigos maiores. escrever e comer lasanha. croquetes humanos! e muita cantiga. um rádio-tijolo e centenas de fotografias. travar conhecimentos, acelarar sentimentos de amizade resguardada pelo tempo. uma pistola de bolhas de sabão, banhos de piscina há meia noite e de mar ao pôr-do-sol. andaaaaaar e apanhar conchas, dores de cabeça. está a chover! e vamos todos para a água. muitos risos, muito gritos, pouco sentido. jogos da bola, claques animadas, médicos e massagistas de óculos de sol. 30 ao todo, 2 paletes de ucal e croissants de manteiga e melocoton. algas (dissolvidas, eram dissolvidas?) praia na noite, um mar escuro e um quentinho no coração que fazia falta. pânico e soluços, mas reconforto certo. roupa encharcada, o que é que eu visto? e vinganças falhadas. músicas que amam joelhos e risos até às tantas. casas-de-banho pequenas de mais e biquinis. SANDES DE CHOOOURA! dança no mar com chuva. azul metálico e verde-água, records no basket e já estou a ver azul. nosolo 15 dias, disso tenho a certeza.

2010-07-15

estamos todos na flor da vida

eles eram das suas vidas protagonistas inatos e peneirentos, inconstantes miniaturas em construção. eles eram os melhores. (nada tinham que ver com pequenos bonecos maravilhosamente sincronizados, a quem não interessava palco de pó, borrão de tinta ou poesia que fosse na cidade supostamente fervilhante em que supostamente viviam.) sorriam na esperança de que por milagre, a aventura que passava por eles todos os dias lhes trouxesse algo de mítico para todo o sempre: sorte e alma.
um pequeno grupo que se metia num autocarro, que saía numa paragem que não lhes dizia nada só para que andassem por ali, a romancear amizades num mundo ancestral que lhes fazia comichão na garganta. gente diferente da outra gente e gente diferente entre si, daí a amizade explodir naquele meio. mas quem morava (morava?) por ali não lhes distinguia diferença. olhos estereotipados não davam ali, e eles quiseram mudar de paragem.
às vezes paravam para cantar e dançar. todos felizes da vida sem o saberem. só um, com o punho fechado (uns pêlos a despertarem aqui e ali) marcava o ritmo, sisudo, das mínimas e das colcheias. quem por ali passava (passava?) não o colocava ali, as festas e abraços que lhe faziam não se integravam no esfusiante espectáculo. logo ali, quiseram mudar de paragem.
apareceram uma vez, tempos depois. cantavam e ainda réstias de esperança em paragens que não de autocarros locais, mas eram apenas sisudas mínimas e colcheias. o artista tinha morrido.

justificando a minha escolha,

a arte e o amor não mudam muito e são parecidos. porque o amor também se educa, caso contrário não existiria inspiração para uma vida em conjunto. e não me preocupam as regras, nem no amor nem na arte, porque o sentimento fala sempre mais alto. daí príncipios amorosos na arte e regras artisticas no amor.
(acreditem que hoje, falo de arte)

2010-07-12

tenho dito #12

imaginar que a minha vida vai ser um documentário, e eu que odeio vozes colocadas.

2010-07-11

directamente para ti, como nunca

um Sol. grande e gordo, sorriso omnipotente e olhos raiantes. um Sol bonito.
o Sol não atrai planetas - isso vem por arrasto. ele atrai uma coisinha, pequenina não se sabe de que cor (azul?), o Sol atrai a Lua. apesar de vistosa, ele sabe-a confusa e envergonhada, pois é o único que lhe vê todas as fases (não 4, mas qualquer outro número ímpar). e ela, contente, raia com ele de aurora em aurora, feliz por todas as flores que sabe cuidar. ela, contente, vai ter com ele Lua Nova, para que ninguém veja o que ele lhe faz, a luz que ele lhe dá. a Lua às vezes é egoísta, mas desculpem-na: ela sabe a sorte que tem.
daqui a 500 anos o Sol vai explodir. a Lua não vai reflectir coisa alguma e já não vai haver ponta de flor em qualquer modesto planeta azul. mas que seja só daqui a 500 anos.

2010-07-09

2010-06-30

às fadas

isto da imensidão das palavras acaba por me assustar um bocado. sou pequenina e imperfeita, e como pessoa confiante, tenho medo destas magias todas que sabem ser como eu. não deixo de gostar delas e é por isso que, em dias como este, em que me sinto especialmente miúda (não menina, miúda), lhes venho dizer tenho saudades vossas. sem desculpa lá, sem itálico algum. eu tenho saudades vossas. lembram-se de como eu me ria convosco, do quanto eu chorava por vocês? ainda o faço, ainda tenho saudades vossas. tenho-me tornado maior; e tenho medo (porque não é mais, é maior). mas não se preocupem, sabem o que o mar me faz ao cabelo (e à cabeça!). tenho ido à praia e pintei as unhas dos pés de rosa barbie. andei descalça num parquezinho qualquer e sujei os pés, mas eles continuaram cor-de-rosa, logo, não há espaço para preocupações (vou dizer...), pequeninas.

2010-06-20

desculpas

a bandeira, a meia haste, acariciava as agulhas quentes do pinheiro (não é um pinheiro) cinzento pelo ar frio da madrugada, a pedir calor. o meu pinheiro, disse ela para a bandeira, a meia haste, descendo a rua e apertando o casaco contra si, a pedir calor. com voz mais pura, sentou-se no chão português sem desenhos e começou a narrar os segundos fantasiosos da alegria que o frio da manhã lhe trazia. a bandeira, a meia haste, envergonhou-se no pinheiro e ela, com voz pura, narrou-lhe isso mesmo. a bandeira deixou de se sentir envergonhada; mas sentiu-se triste, era uma desculpa para a menina, uma desculpa para ela contar histórias. passou uma senhora. a menina, com voz pura, contou-lhe da bandeira: àquela hora os que passavam eram boa gente, gente capaz de se sentar no chão e falar. era uma menina loira, olhos azuis e pouco da vida (não era pouco da vida) e uma senhora que, depois de muito rebolar na cama, se levantou para se sentar num chão que lhe era alegria. eram duas mulheres, uma bandeira e uma árvore (não um pinheiro): eram uma desculpa para escrever.

2010-06-06

céu limpo

dizem que os poetas são sofridos e que as pessoas que se usam das letras para não sofrerem depressões não conseguem escrever quando estão minimamente felizes e é verdade. eu que o diga! estou minimamente feliz e estou triste com a minha atitude perante as palavras, essas que me tiram dos picos e ensinam a dançar. mas, e porque elas são minhas amigas, viram ter comigo com a mesma força e alma de sempre (agora que eu tinha de ir fazer xixi e aquecer os pés). acho que vieram para se vingar e, como dá para ver, estou-lhes a fazer o favor.
criou-se o estereotipo de que o obscuro, o amargo e o sofrimento são muito dificeís de descrever. e são! por isso é que há mares e mares de tinta com lágrimas derramadas em cima. de fazer chorar o meu avô! e o meu avô não chora (lá por causa das teorias dele). mas eu e as palavras com a mínima felicidade à mistura não dá. isso e a expressão 'more than words'. também não dá. o facto não é que as palavras não chegam. somos nós, sou eu vá (eu é que devo ser aqui a esquisita), que não chego lá. não tenho a capacidade de relacionar a palavra nuvem com amor puro. por isso é que não escrevo quando estou feliz. há em mim o medo de estragar aquilo que é tanto quanto são as palavras. tenho medo. tirem-me dos picos.

2010-05-31

os meus direitos dos homens

aquelas pessoas que pensam e vestem e posam para as fotos do hi5/facebook/o raio que o parta e acham e criticam e namoram e escrevem (esta muito especialmente) todas, tooooodas da mesma maneira complicam-me com o sistema que é uma coisa doida. acho que isso sobressai muito por aqui, mas é verdade! e depois riem-se assim: aii estou-me a divertir tanto, ainda bem que a máquina é minha para chegar às tantas e passar isto já para o computador! a sério?! a sério?! isto revolta-me! e nem falo das compras toda a santa tarde livre que apanham. não, falo. se ao menos comprassem uma roupita que lhes valesse a pena, um bocadinho mesmo a nossa cara, um bocadinho diferente do resto, um bocadinho arte, aí até se dava o jeito. mas não, é: aii vi isto ontem lá na escola, vamos lá comprar um parecido. depois é: ai que tenho que estar tão bem e não posso mandar um guinchinho nem coisa que o valha, depois olham para mim de lado!
se calhar sou eu que sou criança. mas esta gente parece que perdeu toda o direito à parvoíce.

2010-05-25

a minha casa futura vai ter aquelas escadas de cordas para subir para a cama!

isto de viver a vida completamente plena não é muito comigo. e então isto de palavras anda só mesmo por papéis. ups! vou só dar umas voltinhas e já cá venho parar outra vez.

2010-05-18

queres ser sorriso comigo?

eu vou ser pequenina para sempre, vooooou! e nem quero comer chupas nem rebuçados. mas vou continuar a sujar a cara de gelado! e vou brincar com a vida e ser muito amiguinha dela! e quando estiver triste, vou buscar palavras, elas gostam de mim, sabes?, e por isso dão-me beijinhos nas feridas e dão-me flores de sorrisos! quando estiveres triste vem ter comigo, eu dou-te palavras também. e elas dão-te flores de sorrisos, elas dão-me a ti. vais ver!

2010-05-13

amor é #6

teres bolhas nos pés e não estares cansada. e nem estou aqui a dançar em palavras bonitas, cheias de sentidos figurados e ilustrados a aguarela abstracta. são mesmo bolhas nos pés, feias, mas que estão lá, nos teus pés, e tu tens que lá pôr a agulha ou lá o que é. mas mesmo assim continuas a ir sabe-se lá para onde - para onde tiveres de ir. e não te sentes cansada, apesar de te sair do corpo. é feio e duro, há cócó na rua e tu nem vês, porque, para ti, há ali amor. e então não estás cansada. (nem suja)

2010-05-06

ai aflito

ela olhava fundo nos olhos dele e num clarão via-se sentada num chão qualquer de madeira clara, de cortinados brancos a deixar entrar muita luz, muita luz, luz dum dia inocente, clarinho, de calor ameno, cabelos num tocar levezinho no ombro rápido, nada de tapar olhos nem de nós absurdos, só um ventinho e um amarelo raiado a entrarem pela janela e a reflectirem na madeira clara quase espelho, onde ela estava sentada, pernas muito tortas e costas muito dobradas e cabeça muito baixa e ela já sem ver luz alguma, um aberto qualquer muito escuro ali na zona das costelas, mais acima das costelas, não nas costelas propriamente, mas um aberto muito fundo, quase que lhe parecia os olhos dele, e ela via-se sem se lembrar dos olhos dele, tudo já muito escuro, madeira envelhecida e cortinados cinzento urbano, qualquer coisa impessoal, um dia já feito noite sabia lá ela por onde tinham ido as horas, sabia dum atalho cortando à esquerda na subida, mas já se esquecera então, tinha lá ido com olhos já nem sabia de quem, e tudo muito escuro, muito aberto e onde estou eu, de cabeça muito baixa à procura do coração, ela que nunca se lembrava dela, tinha cabeça de ar meio poluído era o que era. de repente um apagão e os olhos dele já bem no fundo de si.
- sobe, que depois cortamos à esquerda.

2010-04-29

gosto de escrever com palavras meio vestidas

eu abri as janelas de correr cada uma para seu lado, braços abertos em cima apoiados nelas. deduzi que se as largasse continuaria de braços esvoaçantes por ali, mas deliciei-me na preguiça de olhar para aquele que é o meu azul do céu, que raramente se descobria no meio daquelas horas todas num dia. o sol de correr ia esvoaçando por ali, de braços em cima para trás, mostrando-me as réstias das suas asas azul-pena-de-pato. agredeci-lhe ao ouvido por me saber dar cumplicidade luminosa daquela maneira, e continuei de braços abertos para a frente, a cheirar por ali o ar daqueles minutos que raramente se encontravam por tantos minutos que há num dia. se me dissesse a mim que não era ocupada nem tapadinha o suficiente para me achar impossivelmente disponível, juro-te que continuava ali até apareceres por baixo das janelas de correr e até te explicava que o fado português só faz as pessoas se verem mais felizes, mas stressada por pensar que papéis equivaliam a trabalho bati as asas para outro lado.

2010-04-21

mundo

"a margarida gosta das palavras porque elas a tiram dos arbustos com picos e ela fica feliz e brinca com elas."

2010-04-19

try again

o que sabe melhor é sentires a faca espetada no peito, a matar só o coração. sabe melhor quando dizes à esperança 'quem tinha razão, quem tinha?'. és um tudo poderoso, agora. sabe melhor o sangue a escorrer pelos braços desmaiados qual teatro trágico. sabe melhor agora, sem ver ponta de cobardia em carne alguma do teu corpo. sabe melhor mandar fora a inocência. sabe melhor ter olhos tão-só trovões. sabe melhor um corpo imundo de sonhos esfaqueados a cobardia e de pesadelos de trevas solitárias. sabe-te melhor agora um não-começo de sentimentos. onde nem o alívio reina.
não, não sabe, o sangue é demasiado teu. não sabe.

2010-04-17

missão

ontem vi uma pessoa que não sorriu durante uma hora. e isso fez-me triste. eu sempre pensei que, mesmo sozinhos, nos temos sempre a nós e isso pode ser um entretenimento enorme. mas essa pessoa não sorriu. depois pensei que se nos temos a nós como entretenimento, temos que nos pôr assim para os outros. eu vou ter que a fazer sorrir. ajudam-me?

2010-04-11

tirem o só (não se esqueçam!)

EU GOSTO DE ME PINTAR DAQUELA COR SALMÃO (da cabeça aos pés), e de discordar de todos os que decidem fazer da vida uma mulher fina de costas muito direitas e cara muito esticada. discordar e depois gostar tanto deles que até me apetece pintá-los salmão também. não é uma cor gira? salmão. não estou a brincar, não estou a ser infantil, não me estou a armar em qualquer coisa muito above (tenho reparado que a moda para se armar em coiso e tal é fingir-se que se quer muito estar lá em baixo) nem nada disso. estou a ser normal. quer-se dizer, não estou a ser normal (essa palavra nunca vos fez comichão? é que agora fiquei com a pele vermelha e vou ter que pintar outra vez. salmão!), estou só a ser. é que eu no outro dia experimentei fazer isso e gostei mesmo! só ser (tirem o só), é bom. depois se quisermos podemos acrescentar salmão; ser salmão. depois de só ser (tirem o só), podemos acrescentar qualquer coisa (e nem tem que ser coisa!). somos só nós (tirem o só) que somos, nunca repararam?

2010-04-08

prazer, coração.

és com quem menos me identifico. é difícil falar contigo, sabias? a culpa não está em mim, está em ti. queres todas as maravilhas do mundo (e para ti contam as árvores, as joaninhas, os móveis deitados ao lixo e as gomas) (alguma vez gostaste de gomas?), mas acabas por não ferver por nada, és livre de desejos, nunca soube o que te dar, quando dar, com que cara to dar. tens impulsos manientos, tu própria és manienta, tu és a própria mania. e eu, apesar de sempre ter fervido por ti, nunca me identifiquei contigo.
hoje apetece-me pedir-te desculpa pelas vezes em que me fui embora de ti. pelos tempos que passaste só pela metade, amolgada pela raiva que nunca te quis dar em hora alguma. desculpa por saber, de vez em quando, que ser livre de desejos não faz bem à saúde. desculpa se me esqueço vezes de mais que não tens cabeça e é por isso que não me identifico contigo. desculpa por nem sequer saber que o amor próprio se dá não se sabe onde, sem caras que o atormentem. desculpa por nem sequer ter desconfiado que o amor próprio não olha a entendimentos e que, por livre que é, é difícil de (se) falar.

2010-04-04

pum pum pum

isto anda assim, meio estranho. meio electrónico, que passa pelo tectónico, e vai para o claro, muito badalado e coisas assim, que eu, claro, adooooro. meio irónico, a modos que sim. esta raiva toda apercebeu-se dentro de mim e quis fazer-se ouvir: pum, pum, pum. estás-me a ver a tremer, estás? e eu sei, pensas que é frio, depois vais ao 'será tristeza?', terminas concluindo que é fúria, desististes e pronto, que estou eu a tremer. desistes e vais ter com o teu zézinho, loirinho, fofinho, ai que gosta tanto da minha família, ai que eu também gosto tanto dela, ai que está tudo tão feliz e ai que eu ainda nao desisti de tornar o mundo um roseiral sem picos, sem bichos, sem as folhas que isso também não é preciso.
eu não quero ofender ninguém que eu gosto dos mundos todos que há para aí, seja os sombrios com sangue assim por todo o lado; os preguiçosos que só têm wc, cozinha e ali um sitiozinho para se ser feliz; os berrantes cheios de cor e músicas e arco-iris e chuva para dançar e sol para ir ao mar; esses de rosas sem picos sem bichos sem nada; esses todos muito romanceados com histórias dramáticas e finais uhuh; misturas de uns com os outros; misturas de tudo e mais alguma coisa - eu gosto dos mundos todos que há para aí. mas já que isto se quer fazer ouvir, pum pum pum cá vai, eu gosto muito de mergulhar em mundos sinceros que deitam clichés para os esgotos, devidamente empacotados. gosto muito da diferença que ainda nos faz conseguir caminhar todos juntos para o mesmo sitiozinho: o do amor, um sitiozinho para se ser feliz: seja com luxúria, uma certa solidão ou muitos sorrisos tricolores pelo meio.
eu gosto muito desses mundos todos que há para aí, desde que seja um mundo daqueles com atmosfera que dê para a gente ir ao espaço de vez em quando. eu não gosto de bolhas de água que parecem sempre muito bonitas. pum pum pum e rebentam, estás a ver?

2010-03-21

estação

apetecem-me histórias de amor. estava no carro e fiz umas quantas. entravas sempre. mesmo quando passou na rádio uma música que não conhecia e me desconcentrei a descortiná-la. e eu continuava a inventar as mais estapafúrdias personagens, de barba cor-de-laranja, com cachecóis do benfica, o que quer que fosse que não tinha nada que ver com o teu jeito que posso sempre descrever na perfeição (nunca o faço. as músicas da rádio enrolam-se nos ouvidos). e tu, raios, entravas sempre. ou era um sinal na cara, um caracol no sitio certo (errado, errado), uma adivinha qualquer. metias raiva, e eu chamava as músicas da rádio mas estava qualquer coisa a fazer interferência. então falei contigo. encontrei-te numa personagem estapafúrdia qualquer, e disse-te, com as sílabas bem sonoras: 'tu não és de histórias de amor.' toma, desta é que ias mesmo dissipar.
tu sorriste-me, desta vez eras um médico bem sucedido, com óculos pretos de massa no nariz moreno dos dias de férias na praia. quem se dissipou foram as ondas sonoras da comercial, mais eu de dentro do carro. agora era recepcionista na tua clínica, a que ia ao teu gabinete dizer 'senhor doutor, está demasiado stressado.', e tomava café contigo no fim do horário de trabalho, com conversas das de nome merecido pelo meio. eras sempre tu, mais agora que me descobri a mim no enredo. isto não é de apetites.

2010-03-17

tinha mesmo que ser

tirando a parte em que eu ando pela escola com um cartaz forrado a jornal, a dizer às pessoas para comprarem o 'águas livres' e para mandarem a arte delas para o nosso mail; tirando a parte em que acredito piamente que hoje é o Dia da Folha porque inventei isso no café; tirando a parte da falta de inspiração e tempo para me andar a reinventar e a pintar por dentro; tirando a parte em que tenho andado em testes até dizer chega e o estudo é coisa rarefeita por aqui; tirando a minha corrida e o meu riso que cada vez estão mais estúpidos; tirando os meus joelhos que parecem os dum reguila qualquer sem os dentes da frente; tirando o chocolate todo antes do jantar; tirando a vontade de falar com pessoas que não conheço de lado nenhum só por me apetecer; tirando o facto que cada vez mais gente reparar que o meu atraso crónico é mesmo crónico e é mesmo atraso; tirando o facto de eu gastar letras nisto, ah, e falta o facto da minha vida amorosa ser um vegetal, mas, tirando tudo, eu estou completamente normal. a sério.

2010-03-14

a luta continua #3

- pareces uma criança a comer donuts com creme de chocolate e missangas às cores, não sabes quando parar, não?
- olha lá, e qual é o problema de se ser criança? eu gosto desses donuts.
- obrigada por me pedirem opinião. a sério, eu gostava de me concentrar noutras coisas um bocado mais importantes, posso?
- é para o teu bem. sabes que tens de ser pulso firme com ela e és sempre a mesma!
- deixa-me! eu já não sou assim tão pequenina, eu sei o que me faz bem.
- tu, deixa de ter armar em durona que qualquer dia não tens quem te ature. e tu sabes muito bem a mentira que estás a dizer, depois não te venhas cá encostar e soluçar que já nem pétalas tens.
- e agora?
- somos felizes?
- e agora, somos felizes assim, agora?
- não. agora calam-se.
Itálico

2010-03-13

dicionário de 'mas'

era um mar frouxo, sem ondas, sem algas, um mar de Verão algarvio. era um mar frouxo, tonto, que nos metia raiva de tão preguiçoso. era uma tarde rotineira, de férias com uma praia que, para nós, não acabava nunca. eramos nós num colchão roto, com as horas contadas, gasto como tantos pela nossa animação desmedida, e eram as nossas cabeças encostadas ao plástico insuflável, os nossos cabelos salgados aventureiros na espuma, pela disposição das ondas que nos deixavam estar como sempre estivemos - juntas, não muito afastadas, juntas.
eram os nossos olhos palpitantes que olhavam pela alegria desmedida dos nossos, que sem noção das horas lá deixavam ir mais uns quantos colchões (azuis, baleias, amarelos, bóias, uma prancha), mas para os nossos olhos bonitos nada estragava nada.
"quando alguém te perguntar por ti não respondas, mostra. quem te pergunta por ti não gosta de dicionários.
quando alguém te der a mão, dá a tua devagarinho. é bom sentir o calor da pele a aproximar-se - não há outro igual.
quando alguém te olhar de lado, mostra-te de frente e rasga um sorriso nesse alguém. ainda há muito de quem precise de cor e assimetria.
sabes, Rita, vais esfolar os joelhos muitas vezes. e não é por subires as escadas mais depressa e mais concentrada que isso vai deixar de acontecer. não há definições de feridas, nem de vidas, nem de amores. há muitas cicatrizes, muitas coisas, para caberem em livros de bolso e de consulta rápida. e é por isso, e pela certeza que as tuas sardas me dão, que sei que a tua vida não vai ser de fórmulas mirabolantes, nem de causas perdidas. sabes Rita, eu sei dos teus pinos à chuva, e sei que há sempre alguém que te segure as pernas. tu odeias lama."
uma onda azul, forte, veio, e aterrámos na areia, com as conchas presas no nosso cabelo a rirem-se, desmedidas.

2010-03-10

tão sempre nunca

quando o avião descolou, a minha destreza em me afastar de emoções feias - querida herança de família - impediu-me de olhar tão de perto para esses olhos tão calorentos que se derretiam mesmo perante a minha frieza de coração, coração que estacara faz meses, doze por estes dias, quando tudo era à sua maneira, à nossa. quando tudo era calorento e fresco como o céu de Julho.
mas, lá em cima na sempre nossa terra natal (nasciamos sempre tão lá em cima, calorentos e frescos de olhos brilhantes, era tão inacreditavelmente nosso, era tão sempre nosso), já nos pudémos sentir, de mãos cravadas uma na outra. via-te tão bem de olhar fixo na tão tua cor preferida. vias-me tão bem dormente, como sempre, na tua calma.
e quando já se resumia tudo a 'chá ou café?' aqui e ali, ainda te sentia de olhos cravados nas minhas costas, costas um do outro, que nunca foram mais minhas que tuas. e por isso, tonta como sempre na esperança de que só me visses mesmo as costas, a destreza e o feitiço quebraram comigo embrulhada num céu de Julho que não esse mês onde o meu coração estacara, e deixei emoções derreterem-se líquidas, que se cravavam em ti, mal sabia eu como sequer.
quando o avião aterrou, faz doze meses de 'chá ou café?' desse tão feio dia, e o coração sustinha a mil, disposto a soltar emoções bonitas que nem as praias da caparica, a destreza e o feitiço quebraram. a tão nossa terra natal estava em meses diferentes, em aeroportos que não aquele.

2010-03-08

ondas do coração

tenho-me esquecido de me lembrar de mim. e hoje que voltei, foi do tipo 'olha para o que cresceste!'; foi mesmo. desatei-me a rir. sabem, quando se volta ao porto de abrigo que é um amigo de sempre? podemos rir com as unhas dos pés, se quisermos. eu ri muito, que me lembrei de mim e vi. vi como o meu cabelo cresceu, como da minha cara se passaram réstias de infâncias doces. como já houve quem fugisse de mim. e assim, fiquei triste. mas, como porto de abrigo que me sou, deixei-me ficar de lágrimas marcadas nas bochechas acaloradas até vir outra maré salgada onde pudesse dançar outras canções.
e depois fiquei chateada. não compreendo o porquê das queixas das pessoas. e que lhes falta isto, ai que não tenho aquilo. fogo, e espetei as unhas nas mãos. mas acabei por me lembrar de mim, e parei. não tenho razões de queixa. tenho-me a mim, tenho a terra que me deixa ser eu se quiser, mas que me deixa também esquecer o norte da minha existência. tenho-me a mim, pelo menos metade. (a outra anda por aí espalhada, esquecida porque foi assim que me criei, esquecida de me lembrar de coisas. de me lembrar de mim.)
a outra metade têm vocês, os que me fazem esquecer de lembrar a outra metade de mim.

2010-03-07

guardei-me

sempre que rasgo uma folha e pego numa caneta, eu sei que sai de mim qualquer coisa. tomo isso como garantido, porque, transparente até mais não, sempre deixei sair todos os sonhos que comigo queriam voar. mas agora, agora tenho medo. não quero voar contigo muito alto porque, com vertigens até mais não, foi assim que me fizeram, e o pavor a cair redonda no chão arrepia-me. arrepios enormes que por estes dias têm sido maiores que os que o sonho me provoca, infelizmente.
sonho pequenino, voa comigo rasteirinho, a puxar-me pelas asas. transparentes até mais não, podemos dormir em postes de electricidade e esplanadas de café sem ninguém nos ver. basta irmos juntos e rasteirinhos, no silêncio que só o papel nos trás - e como já provámos dele, sonho pequenino. sempre que rasgamos uma folha.

2010-03-06

tenho dito #9

OS CHAPÉUS-DE-CHUVA VÃO AMALDIÇOAR O PLANETA.
(I'm siiiiiinging in the rain)

2010-03-04

és uma máquina nojenta.

eu só estou aqui mesmo por favor. o bater das teclas é ritmado e harmonioso, mas não é melodia conjunta com o meu coração, percebes? isto anda forte por aqui, anda de vento, esse filho da mãe. e o meu coração só bate forte por aqui por favor, não percebes? ele gosta de lobos, daqueles que uivam alto e que magoam os ouvidos como os cotonetes. grrr, o meu coração magoa-me os ouvidos e ressoa-me na cabeça, este filho da mãe. mas acho que as rapariguinhas que ainda teimam em deixar bater forte e ritmado e harmonioso o coração gostam é desses. filhos da mãe. andas de lobos e não me levas, grr.

2010-02-28

Miguel

cada vez que te vejo tenho saudades tuas. depois acabo sempre por me esquecer, desvairada como sou, mas hoje, hoje que te vi, morro de saudades tuas. sabes, era para ti que escrevia quando na escola me pediam 'escreve uma carta a um amigo a contar...', e ainda para ti escrevo cartas dessas à pressão. hoje é mesmo porque tem de ser - morro de saudades tuas.
lembro-me perfeitamente de onde nos conhecemos, nas apresentações formais da escola de línguas perto do meu alfarrabista preferido, onde vais entrar um dia destes pela minha mão. no dia a seguir estava encostada a um pilar no bloco da Dona Alzira e tocaste-me no ombro porque reconheceste o meu perfil de algum lado. puff.
mudaste a minha vida, e eu morro de saudades dela. as minhas manhãs de Domingo encheram-se de futebol, os intervalos da escola encheram-se de croissants porque mos obrigavas a comer, as minhas mãos encheram-se dos caracóis fartos que ainda hoje tenho como exemplo de cabelo bonito.
eramos os melhores. podiamos bem ter sido os namorados descomprometidos mais invejados da escola, mas fomos antes amantes da vida em conjunto. sabia-te a mão de cor - morro de saudades dessa pequenez gigante toda.
fizeste-me viciada na inocência, e sabes, odiei perdâ-la quando vi o mundo sem a tua mochila meio avermelhada meio sei lá o quê. és o único a quem, apesar de perdidos um do outro, sou capaz de dizer 'quero ser tua amiga até ter filhos ranhosos a quem dar o teu nome'. Miguel, ainda tenho vergonha de quando me ias ver a educação física.

2010-02-25

olfacto

cada amor tem um cheiro. o nosso cheira a folhas de menta com mel por cima. é bom, é de extremos. foi quando, de manhãzinha, estávamos sentados sem fazer nada num centro comercial que ambos odiamos, que eu descobri o cheiro que ambos nutriamos um pelo outro. menta e mel, nada a ver. acho que é por isso que continuamos com o compromisso mais sério de todos sem ninguém se aperceber. eu devo ser a manteiga no meio disto tudo, tu beringela. mas juntos, menta e mel. tudo a ver.
cada amor tem um cheiro. hoje, numa manhã mais avançada, andava eu à caça ao tesouro por entre lixo moderno, descobri um amor que cheirava a livros antigos. apeteceu-me ficar por ali a lê-los. cheirava-me que, faz tempos, foram também extremos opostos que (se) sabiam bem. com a demora, as páginas foram-se colando com a humidade e hoje, são um só cheiro.
cada amor tem um cheiro. quando for grande quero ter uma lavandaria com todos os sabões do planeta e juro-te, ainda vou ouvir um casal, mesmo que seja um daqueles de compromisso sério que ninguém se aperceba, que vai murmurar 'cheira a nós'.

2010-02-24

tenho dito #8

sabem, eu hoje senti-me em CASA.
(kumbaya, my lord, kumbayaaaaa)

um aninho!

parabéns pequenino! hoje faz um aninho que nasceste e que comecei a despejar para aqui todas as babuseiras que me passavam pela cabeça. tornaste-te meu. fiz aqui vinculos, sabes? fiz. e apesar dos mal-entendidos e comentários a que levaste, continuas tão bonito e inocente quanto eras e sempre foste (espero eu).
provavelmente não sabem que eu bebo leite ao almoço, ou que bebo garoto sem açúcar pelo menos antes da aula de geografia, que ando sempre a dançar e sou uma medricas do pior. mas a todos os que me fazem crescer por aqui, obrigada pequeninos e parabéns para voces também :D

2010-02-21

arto-te

- deves mesmo gostar de me fazer esperar.
estava sentada na berma da estrada, de pernas esticadas para aquele parque de estacionamento imundo, com três livros acabadinhos de comprar debaixo do braço e um café mocca na mão. a nossa amizade tinha para aí umas dez pulseiras do tempo atadas à pressa pelos tornozelos, pulseiras essas que nos ensinaram a esperar um pelo outro. a lutar um pelo outro. a adormecer um no outro. a ser, um no outro.
a gostar um do outro ninguém nos ensinou, calhou, por brincadeira das pulseiras pelos tornozelos do tempo. eramos pequeninos e aprendemos a criar. eramos, depois, adolescentes, e aprendemos várias coisas de costas viradas, mas com pulseiras amarelas e lilás para nos lembrarem de nós. as tuas namoradas também aprenderam decerto, que, embora te tivessem na mão, era bem melhor ter-te pelo pé. como eu, como às pulseiras. e hoje, aprendemos que, melhor que criar e ter alguém, é manter uma infância qualquer.
no teu carro ouvia-se boa música; era eu que a comprava, que a escolhia, que a tratava. como tu fazias com a roupa marcante que fazia questão em envergar. (ninguém sabia das nossas pulseiras, mas todos as admiravam. foi assim que crescemos.)
chegámos e fomos ler do mesmo livro; que eu criei, que eu escolhi, que eu tratei. naquela sala marcante que ainda hoje desenhas, escolhes, tratas. sempre me despachei mais rápido que tu:
- espera débora. - e mais umas quantas pulseiras da amizade.

2010-02-19

sabes quem é?

sabes, hoje fui outra vez. fui, sabes. nao interessa quem, eu não fui de certeza! mas fui, fui sabe-se lá quem de sorriso na cara quando bati com a porta da rua e reparei que a roupa que trazia era demasiado leve para o dia cinzentão. fui, quando ansiei por pessoas que não as minhas. mas tu, tu só sabes que eu fui. vamos chamar-me Dulce.
Dulce, quando te vi estavas sentada à chinês na berma da estrada, com o sol a dar-te no cabelo, a cantares com os teus músicas da idade dos porquês. eu estava de fora, mas Dulce, aquele cabelo era meu. aquela voz esganiçada era minha e os teus eram as pessoas que ainda hoje me dão forma à alma. mas Dulce, eu não me importo, hoje foste-me outra vez. de coração aberto e desastrado, de boca aberta a olhar para um arco-íris invertido. Dulce, hoje nem reparaste no meu coração magoado, teu outra vez. limitaste-te a pintar sorrisos às cores. hoje fomos outra vez.

2010-02-16

ele sabia que o que tinha em casa já não era mais a pequenina que fugia dele e se despia nos centros comerciais. sempre teve medo do que ia saber se tentasse descobrir o que ela fazia da vida depois de lhe saltar para cima e lhe fazer cócegas nas dobras dos joelhos, para depois arranjar o cabelo, cantarolar um verso qualquer em jeito de despedida e subir a rua que ele já subira vezes sem conta, depois de lhe despentear o cabelo amachucado entre os lençóis. apesar de lhe saber de cor o gosto esfusiante e a fobia a hábitos integrantes, tinha medo que ela algum dia deixasse de esconder esparguete cru debaixo da secretária para o ir comer enquanto pintava prendas de aniversário, por meio de versos em jeito de até para o ano.

adivinhava-lhe a presença pela voz estridente que tantas vezes lhe debitara matérias nem sabia quais, mais monólogo que diálogo fogoso. percebia-lhe o mau humor quando a via de cócoras na dispensa à procura de réstias impensáveis de chocolate.

mas temia por ela, que de gosto esfusiante estava cheia, e adivinhava-lhe os sonhos amazónicos e devaneios a um passo de se realizarem. tremia no alto da sua barba mal feita quando esta lhe cantarolava versos, pelo terror da despedida.

2010-02-14

pronto

estou cansada. doem-me os pés, que eu ontem matei as saudades todas que tinha do pimba! nunca me apeteceu tanto descomplicar. a minha mãe acabou de mandar mensagem para pôr a mesa. é por estas e por outras que odeio as novas tecnologias. nunca me apeteceu tanto dizer coisas sem sentido. tenho saudades de comer bananas na praia. gostava de saber o que é que o dia 14 de fevereiro tem assim tão de especial, quando me decidir a ter um namorado, vou festejar esta coisa dia 16, tenho dito. aiii, os meus pés. foi tão giro. e a todos os que me viram em sentido ontem, um obrigada por fazerem as minhas férias de carnaval valer a pena.

2010-02-10

fobia

estavas à procura das chaves. sempre achei incrível essa tua paixão por malas pequenas quando a moda é o exagero, e essa impossibilidade de encontrares seja o que for dentro delas. subias as escadas apenas pelo instinto de anos rotineiros, e pelos olhares repentinos que lançavas aos degraus frios, amarelados. estavas cansada. nunca percebi porque é que dás sempre mais nos dias normais, e nos que fazem a barriga da gente passear de metro tu andas aí como se as próprias borboletas falassem contigo. hoje era um dia normal, e tu estavas cansada por causa dessa tua paixão pela pequenez. mas num dos olhares repentinos lançados aos degraus gélidos, as borboletas deixaram a fala das flores. não percebo. são só pontos e rectas pretas vivas em movimento, pensa lá para contigo. mas não. estatelaste as omoplatas contra a parede gélida tal qual os degraus e decidiram, perante a tua pequenez, tirar todo o ar que dançava nas tuas veias. cravaste as unhas nas mãos, bem sei. tentaste subir as escadas apenas com o instinto de anos rotineiros, mas estes tinham ido falar com borboletas lá fora. tropeçaste e o excesso de ar ja te fazia arder os olhos. levantaste-te e a dança animal continuava. correste a olhar para trás, abriste a porta com instinto de saudade. fechaste-a, estatelaste as omoplatas nela e o mar voltava a ti. era e é um dia normal, pensa lá para contigo.

2010-02-09

tenho dito #7

QUE CONTINUO SEM PERCEBER PORQUE É QUE DIZEM QUE NÃO TENHO PERFIL PARA CASAR.

2010-02-07

castelo

hoje não. hoje está um dia frio, luvas e cachecol, demasiado para me vires aquecer na tua ânsia toda de agradar. hoje não, até parece que não sabes que faço de propósito quando me esqueço das luvas na cómoda da entrada. hoje não, hoje não venhas. sabes que gosto de subir estas ruas sozinha, pasmar nas muralhas do castelo a olhar para a casa nelas plantada. há anos que cá não vinha, culpa da família que pouco gosta de recordar. para mim é uma das muitas vidas que levo. por isso, olá avó da mãe, que nunca gostei de te chamar bisavó. sei que nunca fui a tua netinha, nasci em vésperas de revolução e nunca ansiei agradar. mas amaste-me, amas-me, à mesma, como eu ainda ser fazer. subi aqui hoje, de mãos frias, mais para te agradecer que para amar mais uma vez o coração de Lisboa. deixo isso para depois, quando apanhar o sol a jeito. ainda te vejo aí, a fazer croché e a falar com os turistas, nessas escadas fracas para a tua altivez sábia toda. eras deliciosa de se ouvir, e deste-me a descobrir a única coisa que neste momento me agarra a mão. deste-mO a descobrir. a Ele já lhe agradeci poder falar contigo assim hoje, sentadas nas escadas as duas.
a mãe disse que estavas bonita quando foste ter com o avô Bernardo. mas não foi por isso que deixou de chorar. nem o teu netinho parou de tremer. estava lá uma senhora - tu gostas muito dela - que era a única a olhar para mim naquele dia. franzia a testa, à procura da minha reacção. do alto dos meus 9 anos da altura, sabia que não era a confusão dela que importava. era a tua serenidade ao ver a minha calma. subi as escadas e sentei-me no chão com o terço que me deste nestas escadas fracas onde pasmo agora. nunca liguei muito a terços. mas deste-mO a descobrir, e eu perguntava-te se já Lhe vias os pés.
agora sei que tu também me agarras a mão fria, hoje. sei-te bem o tom de pele, está-me no sangue o teu feitio resmungão e sincero, de quem sabe amar, mais que Lisboa. amo-te Eduarda, que me deste a conhecer.

2010-02-06

amor é #4

ouvir as piadas mais estúpidas, mais imbecis e mais azeites que existem, abanar a cabeça e largar um sorriso. um sorriso daqueles pfffa. é inventar histórias para o coelho da vizinha, a comer pipocas numa casa que cheira a queimado porque o nosso menino, enfiado num pijama sujo de magnum de chocolate, insiste na ideia de que as pipocas já feitas vão amaldiçoar o planeta. é não precisar de exibições de parvoeira para fazer rir alguém. é ligar à hora de almoço só para dizer que se está a comer uma banana. e dizer por entre dentes que por ele abdicava da minha fruta preferida. é ouvir um 'hum, hum' do outro lado da linha, e ganhar o dia por isso.

2010-02-02

ressaca

eu sei que sou esquecida. desvairada, isso. não, não te aproveites de mim outra vez, sinto-me culpada mas não tanto. não tanto para me fazeres desaparecer. não deixes deixes isso aí. epá, mete-me isso no frigorífico! não, não vês que não estou pronta?! Os sapatos, Frederico? Desvairada, isso. mete aquilo no frigorífico e encontra-me os sapatos. oh, é só para nos organizarmos! não querias tanto chegar a horas? é só um jantar! sim, o João faz anos. mas qual é a tua prioridade afinal?! assoa-te. raios, perdi o fio outra vez. os sapatos, ah, obrigada. assoa-te! Frederico, não eram as horas? mas qual é a tua prioridade afinal?! nã, vai tu. não encontro os sapatos, está tudo mole no frigorífico, o João faz anos. vai, é muito mais que um jantar, certo? exacto.
(pum, chaves rodam.)
Frederico não, não tanto. não vás, que desapareço.

2010-01-30

keep on dreaming

uma lágrima gorda e decidida rolou pela bochecha e foi cair no tampo da secretária. os olhos vidraram na pequena gota abandonada na madeira. durante muito tempo. mas, de olhos vidrados ainda, atentou noutro seu abandonado. o coração batia forte e inchava, vaidoso. tinha vencido o corpo, a alma, o céu nublado e tudo o que lhe dava vida. tinha ultrapassado a apatia que lhe assombrava os olhos vidrados, que brilhavam de contentes agora. para o coração vaidoso e para os olhos cintilantes não importava mais que tudo estivesse mal no mundo, incluindo o deles. sentiam de novo, a tempestade voltara. a flor acordou pelo meio daquela efervescência toda e correu a enroscar-se no cabelo, dando-lhe mar de novo. era a primeira vez que não se importava com o mal que lhe faziam, a ela, ao coração vaidoso, aos olhos cintilantes. o cabelo já nao era mais deserto, e ela sorria ironicamente. ouvia o ribombar de trovões, bem perto dela desta vez. obrigada céu.

2010-01-28

2010-01-25

o outro lado

afinal era isto que tu querias. já passou, era só fome, comeste e o ovo estrelado que abres na esperança de cozido soube-te bem, as marcas das lágrimas sabem-te bem também já que isso não reflecte vazio algum, era isso que tu não querias, o vazio é frio apesar de Verão quente, ficou uma alga presa ao teu pé, pegaste-lhe na esperança de ser ele a dedicar-te amanhãs, mas a maré baixou e a alga foi, o sol dos dias acabou e as marcas das lágrimas já não te sabem bem porque te sentes salgada de mais, agarras-te às contas de somar e foges que eu sei lá das letras que te fazem cócegas nas costas, foges que te pelas, de quê, sei lá eu.
afinal era isto que eu queria, não saber mais de ti, gostar de Invernos violentos e deixar o sol dos dias, para ti noites, ir, prendo as letras para mim concretas depois de descobrires que não tenho cócega alguma, não gosto das tuas costas sempre tão esguias e divertidas, a somar a isso ainda me chapas a cara, mas porquê, e sei lá eu.
afinal era isto que nós queriamos, vivermos os dois e não sabermos de nenhum, deixar os dias com o sol e fechar os estores partidos, deixarmos de lado a praia e sujarmos a cozinha com ovos estrelados em azeite, para comermos cada um no seu chão marcado com algas de marés que já foram, e mesmo assim dizes que me amas, vê lá vê.

2010-01-24

tenho dito #6

QUE QUEM QUISER ENTRAR E PROVOCAR EM MIM UMA TEMPESTADE DE EMOÇÕES, ESTÁ À VONTADINHA.

2010-01-21

o dia em que odeei a fnac

entrei e tropecei num quadro de serviço de chá. nem liguei, raios para o egocentrismo, tinha causado má impressão. levantei a cabeça, a senhora limpava livros atrás de um caixote; boa tarde. boa tarde menina. não sabia o que procurar, estava um chapéu atigresado pousado em cima duma cadeira. há quantas décadas? subi as escadas, voltei a tropeçar. capa roxa, Sr. Justo. segui, águas passadas não movem moinhos, tal qual as minhas opiniões formadas, leite derramado e justiça por aqui. literatura portuguesa, mil e um titulos a escorrerem-me pelas mãos. É ISTO!, e eu salto para trás. baixo a cabeça, livros empilhados, cabeça entre as mãos, sorriso sabe-se lá onde. volto atrás, livros recentes empilhados num caixote. entra um senhor, pacato de ar de seduções passadas. deviam ainda mover moinhos. boa tarde. pela primeira vez, olho em volta. que pó acolhedor, havia escadas ao fundo. posso descer? pode pode menina, não ligue à desarrumação. ligo pois, desco as escadas, capas mil a desfilarem por mim. aqui o tempo foi de férias, só as lâmpadas se ouviam. e tão bem que destoavam. uma porta escancarada, a minha curiosidade a espreitar lá para dentro. molduras encostadas, molduras das de mortos rigidos, quantos mortos já terão passado ali? uma cadeira de rodinhas, das primeiras que existiram, apeteceu-me sentar nela. a minha descoordenação impede-me, tropeço outra vez. saco de revistas de papelaria recente, destoava. lá dentro, Diários de Noticias que são hoje àguas passadas, que movem moinhos ainda. 1974, só se ouvem as lâmpadas e nao tenho medo de deixar o sonho entrar. um carro miniatura de colecção. apetece-me levá-lo para casa e cuidar dele, fingindo ser colecção manienta do meu pai. subo as escadas, palavras a olhar para mim. livros recentes empilhados em caixotes, livros antigos arrumados em estantes. o busto do camões ferido pela erosão, o fernando pessoa sem cabeça. cheira a sonho. literatura portuguesa, mil e um títulos e mais um preso, vivências e crepúsculo, o sonho entrou, as folhas amareladas são minhas.

2010-01-18

agarra-te a mim

Família, amigos, cultura, cabeça, coração, linhas, céu, mãos. Família, amigos, cultura, cabeça, coração, linhas, céu, mãos. Vá, repete, mais uma vez, estou aqui para te dar força quando já não o sabes ser. Repete, vê, repara, tens muito, é bom, e eu já estou a desesperar por não o veres. Tens quem te abrace no escuro, tens-te a ti nas horas de tédio e miséria, com inspiração suficiente para olhares para o céu quando não há pedaço de ti que não esteja partido, mas sabes-te de punhos cerrados para não te deixares desaparecer. Sabes a maneira exacta de dar magia ao teu dia, ao teu espreguiçar, ao teu pé na poça. Pára de bater com a cabeça nos joelhos e beber soro porque gostas da sensação de lábios secos, pára. Tens isso tudo, coração, e eu só te tenho a ti.

2010-01-17

o corrimão era verde

estavamos os dois sentados numas escadas das traseiras dum prédio qualquer, cheio de grafitis racistas e asneiras mal ditas, mal desenhadas e mal interpretadas. eu tinha nojo daquelas escadas, de todas as pastilhas coladas em pedras reclusas num mundo que não mais se constrói. tinha nojo, mas a minha avó andava por aí e a flor que me querias dar murchava por amanhã. era reles e decadente mas havia paz quando mergulhava os meus ouvidos na tua camisola de lã e os meu olhos só viam pedras presas por entre ervas daninhas. e aquilo chegava para afastar as saias da minha avó, de quem herdara a falta de paz e o gosto pelo vento.
trazias a flor mergulhada num liquido sem cor, tal asneira sibilante. amarguinha, a flor que me ias dar ia murchar já por aquelas horas de paz colada aos meus ouvidos. trouxeste o jazz que te pedi, ouvimos com o copo e a flor pelas horas dos finados. não haviam frases tiradas à pressão, para nós chegavam as que saíam porque tinha de ser, e não mais nos demoravamos em conversas longas e de vidas que não as nossas, com copos e flores pela metade. quanto mais as histórias dos nossos nomes fotografadas por satélite, à distância de anos-luz que iam morrer antes mesmo de lá chegarmos. o silêncio pela metade servia-nos. tu não gostavas das saias de fazenda da minha avó e eu não gostava da herança que ela me dera. dela não tinha o todo inteiro que era desde que tinha a minha idade e procurava paz em traseiras de prédios que não tinham grafitis. era de metades e a mão já nem chegava para contar quantas tinha. dizias que se houvesse alguma história a anos-luz para contar seria a de que pessoas às metades se juntavam e continuavam sem fazer um todo inteiro. nunca fomos um, nunca o seremos. dá graças, meu amor, dá graças aos anjos, às flores e aos copos.